Tá com dó de bandido? Leva pra casa! - A Sina do Advogado Criminal

O Advogado Criminal é constantemente rechaçado pela sociedade e até mesmo dentre os Colegas de profissão que atuam em outras áreas.



Hoje de manhã estava a comentar com uma colega de profissão sobre um pedido frustrado de Liberdade Provisória. Na mesma oportunidade, comentei que estava já a preparar o Habeas Corpus, e que estava inconformada com o indeferimento do meu pedido, diante de todas as provas que foram apresentadas.
Durante a conversa, fui surpreendida por uma terceira pessoa, também colega de profissão, mas que atua em área diversa, dizendo: "Ah, vai dizer que o cara é um santo? Me poupe! Tá com dó, leva pra casa!".
Chego a perder a conta de quantas vezes no dia ouço esse tipo de coisa. Ainda mais eu, criminalista apaixonada, que faço questão de gritar aos quatro cantos do mundo o meu amor pelo Direito Penal. Na grande maioria das vezes, não costumo responder, mas achei pertinente escrever sobre isso, já que me parecem jargões passados de geração em geração e que não produzem nada além de ignorância e intolerância.
Para começar, vamos esclarecer uma coisa: nós, criminalistas, não defendemos bandidos.
O que defendemos são os direitos de uma pessoa que está sendo processada criminalmente (lembrando que, pela presunção de inocência, todo mundo é inocente até uma sentença condenatória transitada em julgado). O que se defende é o cumprimento da lei, de modo justo. E esse é o nosso papel.
Jargões como "bandido bom é bandido morto", dentre outros, são ditos todos os dias por inúmeras pessoas. Entretanto juristas, conhecedores do Direito, bem como os simpatizantes, deveriam extinguir esses jargões de seus vocabulários.
É evidente que ninguém é a favor da criminalidade. Ninguém quer viver com medo. Mas exterminar todos os criminosos é a solução para isso? Tratá-los como a escória da sociedade é a solução para isso? Deixá-los apodrecer junto ao nosso tão precário sistema carcerário é a solução para isso?
Se fosse, seguramente seríamos uma referência mundial da paz, haja vista o aumento substancial no número de encarceramentos nos últimos anos. Todavia, os dados da nossa criminalidade apontam o contrário.
Não obstante, é importante salientar que independente de quem seja o cliente, o advogado é um profissional a desempenhar sua função, e nada mais que isso. O advogado tem a função de garantir que os direitos de quem quer que seja seu cliente sejam respeitados. Afinal, o direito é para todos, inclusive para aqueles que nos causam repulsa.
A função do advogado no exercício da defesa de seu constituinte não deve ser confundida com o próprio constituinte, muito menos com o crime praticado por este. A OAB/SP, em Nota Pública datada de 16 de fevereiro de 2012, alertou que:
"O advogado criminal não pode ser confundido com seu cliente; nem deve ser hostilizado pela sociedade, porque está no exercício da defesa de seu constituinte e cumprindo o que estabelece o art. 133 da Constituição Federal, tendo a seu lado a garantia da inviolabilidade de seus atos e de manifestações no exercício profissional". Fonte
O Advogado Criminalista desempenha uma nobre e difícil tarefa de batalhar pelas garantias mais fundamentais, pelos direitos mais intrínsecos, muitas vezes na contramão da opinião popular, e exerce, às vezes a muito custo, o papel de zelar pela Constituição e pela segurança jurídica. 
Lembrei-me também de mais uma que estou acostumada a ouvir: "queria ver você defender o bandido se ele assaltasse sua família".
Ora, é claro que se minha família fosse vítima de um crime, eu não poderia ser advogada do réu. Por isso mesmo o réu deveria ser representado por um advogado neutro, que pudesse realizar a defesa técnica sem influências externas e sem prejuízo de sua defesa.
Não é óbvio isso?

Além do mais, se eu tenho dó de bandido? Não, não tenho, mas exerço minha função da maneira mais ampla que consigo, buscando garantir o direito do meu cliente, independente de quem ele seja. Não tenho "dó de bandido", mas sou legalista? Sim! E garantista também. Utopia? Talvez, mas no que me couber, faço valer a nossa Constituição e os direitos de quem quer que seja.



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6 comentários

  1. Excelente texto. É muito comum esse tipo de manifestação do senso comum, como também de colegas do Direito. Triste, pois em tese, não são leigos.

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    1. Obrigada, Dr! Acredito que os profissionais do Direito deveriam respeitar, acima de tudo, as garantias fundamentais, diferenciando-se do senso comum. Infelizmente não é o que acontece sempre.
      Abraço.

      Dra Camila

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  2. Excelente artigo! Deveria ser divulgado em cartilhas para a sociedade julgadora.

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