Prática previdenciária: a emoção do primeiro cliente!

Nova Coluna do blog, "Descomplicando a Previdência", com a Dra Allana Araujo, advogada previdenciária.



Meu primeiro contato com o direito previdenciário aconteceu na faculdade, como é de se esperar (risos). Mas, naquela época, eu tinha muitas certezas e, uma delas era que eu jamais atuaria na área de previdenciário e trabalhista, (mais risos porque eu certamente não sabia de nada), veja só como a vida aplica peças nas pessoas cheias de certezas.


Meu professor da graduação tinha uma maneira tão chata incrível de ensinar direito previdenciário que, somando isso ao o ar condicionado congelante da sala de aula, tudo que eu queria fazer lá era dormir. Definitivamente não estava nem um pouco preocupada com o fator previdenciário e como ele podia influenciar na minha aposentadoria: Que aposentadoria se eu nem era contribuinte ainda?

Enfim, aquela jovem estagiária do MPF que adorava o direito penal, que fez a segunda fase da OAB em direito penal, que se achava a verdadeira penalista, foi para a prática diária da advocacia sozinha, sem nenhum Procurador da República gente boa (meu orientador de estágio no MPF) para dar o feed back sobre o meu trabalho e, tampouco, professor de prática jurídica para corrigir minhas peças e descobriu que não era penalista coisa nenhuma.

E, como qualquer mulher que quer comprar sapatos e bolsas, eu precisava ganhar dinheiro, afinal, estes itens básicos para a vida de uma advogada não caem do céu, apesar que esta não seria uma má ideia para São Pedro aderir, melhor que chuva de canivetes. 

Fui à luta (ainda estou) e comecei a advogar em um escritório de um advogado (papai Noel da advocacia – leia-se um senhor, casado e pai de cinco filhos, não o namorei) que me deu casa, comida e roupa lavada.

Brincadeira, na verdade, me deu uma sala (sem móveis) e um lugar ao sol na advocacia sem me cobrar nada por isso, nem aluguel, nem porcentagem, nem despesas, nada MESMO. E não pensem que era porque eu sou A advogada, não, é porque, segundo ele, minha mãe (uma senhora casada e mãe de três filhos) é uma pessoa muito querida na igreja e ele gosta muito dela. - OBRIGADA MÃE, te devo mais essa!

Enfim, na prática o que cai na rede é peixe, ou nesse caso, honorários, então o que começou a chegar foram causas trabalhistas para minha (in)felicidade. Eu, que nunca levei a sério as aulas tão legais (só que não) de direito do trabalho, fui à busca de uma pós graduação na área para desempenhar o meu labor (falei bonito!) da melhor maneira.

Aí, um belo dia de sol, quando eu já não trabalhava mais no escritório do advogado Papai Noel, uma cliente daquela época me trouxe uma cliente em potencial, residente da zona rural, trabalhadora em regime familiar em área menor que 4 módulos fiscais, ou seja, segurada especial do INSS, portadora de uma grave doença nos rins e não conseguia mais trabalhar.

Naquela ocasião ela tinha o pedido de auxílio doença negado na esfera administrativa do INSS e queria requerê-lo judicialmente. Nessa hora eu pensei: “Vou ligar para um colega que atua na área previdenciária”.

Afinal, eu não sabia nada de nada de direito previdenciário, só lembrava que era aquela matéria da faculdade que me dava sono (MUITO). Do semestre inteiro eu só me lembrava do nome do professor que, na verdade, era difícil esquecer, até porque o sujeito foi meu professor de inglês no ensino fundamental e médio e, na faculdade, me deu aula de direito civil parte geral, previdenciário, processo do trabalho I e II e pratica civil, acho que mais nada... Ninguém esqueceria o nome de um professor Bombril (brincadeirinha professor, Assolam é melhor). rs

Segundo os relatos da cliente, o requerimento tinha sido negado porque o sindicato não emitiu uma certidão confirmando a condição de trabalhadora rural e, sem provas suficientes que cumpria os requisitos para ser segurada especial, o INSS indeferiu o pedido.

Eu, como uma boa pessoa ( que estava pensando em agradar a cliente trabalhista que tinha indicado a tal cliente em potencial) liguei no sindicato pensando que eles emitiriam a certidão e aí eu faria um recurso administrativo simples e plim! Tudo resolvido, todo mundo feliz e eu não ia precisar aprender direito previdenciário naquela altura da vida que eu já estava atuando em trabalhista e pra mim já era demais.

Mas, o sindicato alegou que ela teria que pagar todas as contribuições atrasadas, que somavam mais de R$ 400,00 (quatrocentos) reais, porque sem o pagamento eles não iriam emitir o documento e ela não receberia o benefício MESMO. Sim, foi isso que a secretária me falou, MESMO.

Eu fiquei indignada, liguei para o advogado do sindicato (meu conhecido, cidade pequena, né?) e ele foi categórico: “Tem que pagar, filhinha(sim, ele fala assim com as pessoas), porque senão o sindicato não tem como arcar com as despesas das certidões e vai acabar fechando as portas”.

Oi? Como assim? Uma folha de papel, gente, R$ 400,00 por isso? O pessoal não paga isso para advogado fazer audiências de instrução que toma horaaaas do dia de um profissional e o sindicato, feito para ajudar (teoricamente) sua classe, cobrando indevidamente um valor absurdo de uma pobre doente que trabalhou a vida inteira sob o sol da toscana (o sol de Rondônia mesmo), que mundo é esse?

É, fiquei indignada e nada melhor que a indignação para nos mover na vida e falei assim para ela: “Olha, vislumbro uma possibilidade real de ganho neste caso, mas, nada no direito é garantido 100%, portanto, o correto é não criar expectativas e blá, blá..."

Pois é, procurei algum livro de direito previdenciário na minha mini-minúscula biblioteca e descobri que não tinha nada, não sabia nada, que tava rodada e tinha que estudar igual quando ia fazer prova da faculdade (de novo)!

Depois de superada essa parte, chegou a hora boa! Hora de ir ao banco sacar o retroativo (sim, eu vou junto com o cliente). Aquela cliente ficou tão feliz com aqueles quase três mil reais nas mãos dela de uma vez só, foi lindo de ver, foi lindo de ver meu honorário também.

O filho dela disse: “Mamãe, agora você vai poder comprar aquela pacote de bolacha recheada para mim, né?, a Dra já resolveu seu caso”. Avê, eu quase não me aguento, mas, segurei a onda e mantive a pose de advogada durona!!

Enfim, a satisfação daquela cliente me emocionou muito, foi ali que eu descobri quão bonita pode ser a nossa profissão e, querendo ou não, a área de direito previdenciário tem um público que, na maioria das vezes (tirando os espertalhões), precisa ou, podemos dizer, depende daquele dinheiro para viver com um mínimo, bem mínimo mesmo muitas vezes, de dignidade.

A partir daí, abri meu coração para o direito previdenciário e, então, meu escritório encheu (mentira) de clientes querendo se aposentar sem nunca ter contribuído na vida e eu passo todos os dias explicando que isso não é possível e, todos eles me acham uma advogada muito fraquinha porque o advogado do vizinho conseguiu fazer esta façanha jurídica.

Pois é, não é fácil explicar a diferença de benefício assistencial e aposentadoria por idade para as pessoas, mas, deixo isso para o próximo post.












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3 comentários

  1. Muito bom!
    Parabéns pelo post,me motivou a fazer previdência também rsrs

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  2. Parabéns acho que estou no mesmo barco, sucesso ai Doutora (com o devido respeito) linda!!!

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  3. Allana, Existe luz no fim do túnel? Continua mantendo sua área em Previdenciário? Assim como você, durante a universidade, mas tenho interesse em atuar.

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